Fundo de comércio não se aplica a sociedades simples

Em sociedades formadas por profissionais liberais, centradas no exercício pessoal e intelectual dos sócios, como consultórios médicos, laboratórios de pesquisa científica, escritórios de arquitetura, entre outros, é comum surgirem dúvidas sobre o que integra o patrimônio social quando um dos sócios decide se retirar. Um ponto sensível, e muitas vezes mal compreendido, é a existência (ou não) de fundo de comércio nessas sociedades, especialmente na apuração de haveres de um sócio retirante. 

O fundo de comércio é um conceito tradicional da atividade empresária. Trata-se de um conjunto de bens materiais e imateriais organizados para o exercício de uma atividade econômica. Pode incluir o ponto comercial, a marca, a carteira de clientes, a reputação no mercado (goodwill), entre outros ativos intangíveis. É justamente esse conjunto que, em sociedades empresárias, costuma ser valorizado em caso de dissolução parcial. 

O Código Civil faz uma distinção clara entre sociedades empresárias e sociedades simples. Enquanto as primeiras exploram atividade econômica com estrutura organizada e finalidade mercantil, as sociedades simples se dedicam a atividades intelectuais, científicas, literárias ou artísticas, como é o caso típico de clínicas médicas. Nessas sociedades, o capital imaterial, como a clientela e o reconhecimento profissional, está diretamente vinculado à pessoa do sócio, não à sociedade. Logo, não se configura como ativo transmissível ou apropriável pelos demais sócios. 

Em julgamento recente (AgInt no AREsp 1.040.031/SP), a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou esse entendimento: em sociedades simples, não há que se falar em fundo de comércio. Elementos como clientela e acervo técnico são considerados personalíssimos e não integram a apuração de haveres. O raciocínio do Tribunal foi objetivo: ao se retirar da sociedade simples, o sócio leva consigo seu capital intelectual, sua experiência e reputação, e esses elementos não podem ser valorados ou repartidos. 

Para os sócios de sociedades simples, a decisão do STJ reforça a diferença entre patrimônio pessoal e social, além de servir como orientação para evitar litígios em dissoluções parciais.

 

Equipe Societária/M&A

Caselli GuimarãesComentário