O novo marco legal do mercado de câmbio - Lei nº 14.286/21

Desde o dia 02/01/2023 as operações de câmbio realizadas no Brasil devem seguir a lei 14.286, o novo marco legal de câmbio do país. As mudanças são referentes às transações do mercado de câmbio brasileiro, o capital brasileiro no exterior, o capital estrangeiro no país e a prestação de informações ao Banco Central.

 

Ainda há possibilidade de novas mudanças e revisões em novembro de 2023. No entanto, as determinações da atual lei já estão aprovadas e vigentes.

 

As operações de câmbio agora são realizadas de forma mais ágil. As pessoas físicas e jurídicas em geral passam a indicar a finalidade dessas operações, o que antes era feito pelos bancos e corretoras autorizados a operar no mercado de câmbio.

 

Além da parte prática de prestação de informações, houve mudanças no tratamento de movimentações de contas de não residentes no Brasil ao das contas de residentes no país, que agora é o mesmo.  Outra mudança é sobre os critérios em relação às informações e documentos comprobatórios, visando prevenir lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo.

 

Vigente desde 30/12/2022, a lei trouxe modificações ao mercado de câmbio e simplificações jurídicas sobre o assunto:

•          Ampliação das competências, atribuições e responsabilidades do Banco Central;

•          Concessão de tratamento a não residentes similar ao dispensado a residentes no País;

•          Concessão de acesso ao mercado de câmbio para empresas estrangeiras;

•          Autorização para aplicação no Brasil ou no exterior de recursos captados no País ou no exterior, inclusive com não residentes;

•          Vedação de exigência de dados e documentos de clientes que estejam disponíveis em bases de dados públicas ou privadas de amplo acesso por parte das instituições autorizadas a operar no mercado de câmbio;

•          Permissão de manutenção, no exterior, dos recursos em moeda estrangeira decorrentes de recebimentos de exportações brasileiras de mercadorias e de serviços para o exterior, sem condições específicas ou limites de valor;

•          Elevação do limite de porte de moeda estrangeira em espécie na saída do País para US$ 10mil;

•          Transações de moeda estrangeira em espécie entre pessoas físicas até o limite de US$ 500,00, de forma eventual e não profissional.

 

Um critério de proporcionalidade também foi incluído na nova lei, levando em consideração valores e perfis da operação. Como exemplo, houve a simplificação da classificação das operações em geral de até US$ 50 mil, que passam a ter somente 10 códigos para indicação da finalidade. Antes eram mais de 180 códigos de indicação.

 

A prestação de informações de capitais estrangeiros é exigida nas seguintes situações, com seus respectivos códigos:

•          Crédito externo superior a US$1 milhão;

•          Importação financiada de bens ou serviços superior a US$500 mil com prazo de pagamento maior que 180 dias;

•          Recebimento antecipado de exportação e arrendamento mercantil financeiro externo superior a US$1 milhão com prazo de pagamento maior que 360 dias;

•          Investimento estrangeiro direto com movimentação superior a US$100 mil;

•          Investimento em portfolio (carteira) de não residente no Brasil;

As operações são classificadas em códigos diferentes para Pessoa Física e Pessoa Jurídica, sempre segmentando em valores acima e abaixo de US$ 50 mil. Para ver a lista completa: https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/operacoes-de-cambio

 

Para regulamentar a Lei nº 14.286/21, o Banco Central do Brasil publicou, em 31/12/2022, seis resoluções (n. 277, 278, 279, 280, 280 e 281) que regulamentaram a normativa em relação ao mercado de câmbio e ao ingresso no País e à saída do País de valores em reais e em moeda estrangeira, em relação ao capital estrangeiro no País, nas operações de crédito externo e de investimento estrangeiro direto, bem como a prestação de informações ao Banco Central do Brasil, dispôs sobre o capital brasileiro no exterior, em relação à definição de residente e de não residente a ser aplicada para pessoas físicas e jurídicas, em relação ao capital estrangeiro no País, nas operações de crédito externo e de investimento estrangeiro direto, bem como a prestação de informações ao Banco Central do Brasil e dispôs sobre a política, os procedimentos e os controles internos a serem adotados pelas instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil visando à prevenção da utilização do sistema financeiro para a prática dos crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores, de que trata a Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, e de financiamento do terrorismo, previsto na Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016.

 

O novo marco legal permite que bancos e instituições financeiras invistam no exterior recursos captados no Brasil ou fora do país, além de facilitar o uso da moeda brasileira em transações internacionais. Segundo o governo, isso ajudará a financiar importadores de produtos brasileiros. O fluxo de recursos agora é direto entre empresas do mesmo grupo.

 

Apesar dessa flexibilização, as contas em outras moedas no Brasil ainda não serão permitidas. Segundo a lei, compete ao Banco Central regulamentar quem pode ter conta em moeda estrangeira no Brasil e quais são os requisitos. Ao abrir essa possibilidade, o novo marco legal permite que, no futuro, autarquia autorize pessoas físicas a manter contas em dólar no Brasil, por exemplo.

 

A lei também aumentou a lista de casos em que será permitido o pagamento em moeda estrangeira de contas em território nacional. Passam a ser permitidos os pagamentos de contratos de arrendamento mercantil (leasing) feitos entre residentes no Brasil se os recursos forem captados no exterior. Também fica valendo a exportação indireta, quando produtores de embalagens, montadores ou vendedores de insumos fornecem esses materiais ou serviços para empresa exportadora. Os pagamentos de linhas externas de crédito para as transações desses empresários poderão ser feitos em moeda estrangeira.

 

Uma das mais relevantes propostas que traz a nova Lei é a de promover a conversibilidade do real, mediante a edição de dispositivos que incentivam a internacionalização da moeda. Para atingir essa finalidade, o legislador fez questão de declarar, no art. 9º da Lei, a obrigatoriedade de tratamento igualitário ao capital estrangeiro àquele concedido ao capital nacional; e, dentre outras disposições adotadas para o atingimento desta finalidade, destacamos duas que podem surtir positivos efeitos às empresas nacionais: a possibilidade de cumprimento de ordens de pagamento em reais recebidas ou enviadas para o exterior; e a possibilidade de concessão de empréstimos a estrangeiros não domiciliados no país, de modo a possibilitar o financiamento a importadores estrangeiros de produtos nacionais.

 

O art. 12 do Marco Legal inova ao permitir a compensação privada de créditos ou de valores entre residentes e não residentes no país. Com essa permissão, portanto, espera-se que as operações, que objetivam essencialmente compensações, não mais necessitem ser realizadas na íntegra, com posterior ajuste pela diferença. As hipóteses em que as compensações serão permitidas, contudo, dependerão de regulamento próprio a ser editado pelo Banco Central.

 

Para aumentar aceitação do real em outros países, a lei passa a permitir expressamente o recebimento de ordens de pagamento de terceiros do exterior a partir de contas em reais mantidas no Brasil por meio de bancos estrangeiros. Para isso, os bancos que fizerem esse tipo de operação vão precisar obter informação sobre o banco estrangeiro. A intenção é aumentar o controle em matéria de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo.

 

As empresas que remetem dinheiro ao exterior a título de lucros, dividendos, juros, pagamento por royalties e outras finalidades regulamentadas poderão fazê-lo sem a necessidade de registro perante o Banco Central, como ocorre atualmente. A única exigência passa a ser o pagamento do imposto.

 

Com a entrada em vigor da lei, várias atribuições do Conselho Monetário Nacional (CMN) passam para o Banco Central, como regular operações de câmbio, contratos futuros de câmbio usados pelo Banco Central para evitar especulação com o real (swaps) e a organização e fiscalização de corretoras de valores de bolsa e de câmbio. No momento, a minuta da regulamentação do Marco Legal do Câmbio aguarda validação pela Diretoria Deliberativa do órgão, após o encerramento da Consulta Pública nº 93/2022.

Martha Gallardo Sala Bagnoli